segunda-feira, 18 de junho de 2012

Mudei

Eu tinha um blog muito cheio de coisas, muito pré-adolescente, cujo link não coloco aqui de jeito nenhum. Aí mudei pra esse daqui, com essa pegada Huxley no nome. Mas foi indo e indo e acabou do mesmo jeito: colorido e desorganizado demais. Somado a isso, o Blogger mudou a plataforma de postagem (interface, sei lá o nome) e ficou bem agoniante de mexer. Então resolvi levar todos os posts antigos e os eventuais novos para um outro endereço. Ei-lo.


Nos lemos lá.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

"Eu odeio esperar"

Tenho ouvido isso muito nos últimos anos, virou uma dessas modas sociais estranhas. Mas há um outro lado.

A espera de um bebê são 9 meses de gestação, tempo recheado de experiências. Os 15 minutos na sala do dentista são, na verdade, uma matéria de uma revista antiga que você não leu pois não viu na época e que nunca teria lido se não tivesse esperado esses 15 minutos. Os 10 minutos que demoram entre a ligação e a chegada do táxi? É um dente escovado, um acessório a mais na roupa, um laço bem dado no tênis. A lentidão do metrô é um capítulo a mais de um livro, uma música a mais no iPod.

Paciência é uma virtude que precisa ser adquirida o mais rápido possível.

sábado, 14 de abril de 2012

Pagando pra ver

Acabei de ler uma HQ chamada "Paying For It". É a história real de um cartunista que decide que não quer ter mais namoradas e começa a fazer sexo apenas com prostitutas.

Depois de terminar um namoro e presenciar o novo relacionamento cheio de brigas da ex, Chester Brown percebe claramente que a ideia de amor romântico é um porre, causa mais dor do que alegria e quer pular fora desse barco. Ele defende que o sucesso dos relacionamentos são momentâneos pois as pessoas mudam - não necessariamente na mesma direção e isso é normal ("Me sinto uma pessoa diferente da que era há 10 anos e uma muito diferente da que eu era há 20 anos", exemplifica).

E aí o que sobra? Só chateação. Estar em um relacionamento amoroso sério não te garante sexo na hora que você quer. E se a única parte boa da relação é o sexo e você consegue sexo fácil fora de uma relação, pra quê ter uma relação?

A mãe de um dos amigos do tal cartunista fala que ele não tem respeito próprio ao saber que ele saiu com prostitutas. Chester diz que ao contrário do que pensam, se sente muito bem na vida e consigo mesmo e ainda argumenta: "Olha só o nosso amigo R, que acabou de levar um fora da namorada. Ele está péssimo tem muito tempo, ele está sofrendo. E porque ele está sofrendo? Pois ele foi rejeitado, pois ele precisa de alguém que esteja apaixonado por ele. Sem essa voz externa dizendo 'Te amo', ele desmorona. É por isso que pessoas precisar de relacionamentos, pois são inseguras. Precisam de alguém do lado de fora dizendo que elas são amáveis. Ou bonitas. Ou legais. Um cara com respeito próprio é um cara que não precisa estar num relacionamento [pra ser segura de si]". Interessante, não?

Pouco depois, ele conta aos amigos que deu uma de suas HQs para uma das prostitutas que ele vê. "Ela sabe o que você faz? Você conversa com elas?", perguntam os colegas. "Conversar - conhecer um pouco da moça - é um adicional à experiência. A faz parecer menos fria e impessoal", responde. E seu amigo recomenda: "Aqui vai uma ideia: se você quer ter uma experiência sexual que não é fria e impessoal, arranje uma namorada". Hum, touché.

O livro levanta várias questões interessantes sobre a invenção do romantismo ("no passado, era comum desenvolver afeto pela pessoa com quem você tinha se casado, mas amor não era motivo para casar. As pessoas casavam por dinheiro, status, famílias, acordos etc") e, mais para o final, começa até um debate sobre a legalização da prostituição - e de um ponto de vista que nunca tinha prestado atenção e que me surpreendeu.

No final, a mensagem é que cada um sabe da própria vida, cada um deve ir atrás do que acha certo para si - mas sempre é bom dar umas paradinhas no caminho pra ver se você está indo pro lugar que você quer ou pro lugar que estão te falando pra ir.

"Paying For It" não tem edição em português ainda, mas tem uma linguagem fácil, não é preciso ter um inglês afiado não. E vale muito a leitura, é um tipo de reflexão bem ímpar e, convenhamos, diferente. Muito do que é produzido atualmente pela indústria cultural é pra reforçar essas ideias de amorzinho e mimimi.

Mas o buraco é mais embaixo, claro. A gente lê essas coisas, entende, aceita, dá razão - mas não funcionamenos bem assim. É exatamente como Woody Allen diz em "Annie Hall":

O cara vai ao psicólogo e diz: "Doutor, meu irmão está louco; ele acha que é uma galinha". E o médico diz: "Bom, e porque você não interna ele?", e o cara diz: "Até internaria, mas preciso dos ovos".

Acho que é assim que me sinto sobre relacionamentos. São totalmente irracionais e loucos e absurdos. Mas a gente continua insistindo neles pois a maioria de nós precisa dos ovos.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Envelhecer, o elefante branco da comunidade gay


Em janeiro, um bem-sucedido terapeuta gay de Manhattan chamado Bob Bergeron cometeu suicídio. Sim, esse moço bonito da foto. Ele tinha 49 anos e estava prestes a publicar o livro “The Right Side of Forty: The Complete Guide to Happiness for Gay Men at Midlife and Beyond”. É, um livro de auto-ajuda direcionado aos gays com mais de 40 anos.

Sua filosofia era uma tentativa de convencer a si mesmo ou apenas uma maneira de ganhar dinheiro? Não sei. Mas muitos grupos gays são exageradamente baseados em beleza física e novidades, então acho que de qualquer forma vale a reflexão. Afinal, ao mesmo tempo que não devemos antecipar nossa velhice, não seremos jovens para sempre.

Nada contra quem fica por aí brigando sobre qual seriado de TV é melhor, gastando horas do dia decorando coregrafias de clipes ou na academia, gastando tubos de dinheiro em roupas e produtos tecnológicos da moda, mas espero sinceramente que essas mesmas pessoas estejam também buscando algo a mais da vida. Que elas queiram se conhecer mais, se desenvolver mais, compartilhar mais. Que reflitam um pouquinho sobre a vida, a morte, a efemeridade da existência. Ao contrário do que parece, pensar sobre isso não quer dizer ser obscuro, deprimido ou pessimista. Sair do armário para si e para o mundo pode ser muito doloroso, mas não quer dizer que a partir daí é só festa não.

O desafio mesmo - e esse não é só para os gays, claro - é conseguir ser feliz consciente da velhice, da doença, da morte e da solidão. Viver negando essas coisas é pra lá de fácil, existem vários jeitos. Mas, se negar essas coisas é a única maneira de você conseguir ser alegre, há algo errado. Não fica uma coisa meio falsa e histérica? Não cansa? Pois é. Fazer as pazes com a própria existência é o único jeito de estar satisfeito.

Satisfeito, pois "feliz" já seria uma palavra grande demais.

sábado, 24 de março de 2012

Vivendo sua vida w/ 689 others


Numa conversa essa semana, descobri que uma amiga tirou nada menos que 4 mil fotos do Vaticano quando esteve lá. Quatro mil! Precisava? É pra decorar cada detalhe do lugar ou é pra voltar pro Brasil e mostrar cada detalhe pros que não foram. A experiência tem que ser validada pelos outros?

Acho que qualquer resposta merece atenção: se em uma viagem você para a cada segundo para uma foto, deixa de experimentar aquele lugar de verdade. E abastecer seu Facebook com todas as fotos mostra que você ou é muito narcisista ou que quer que sua vida online represente com fidelidade a sua vida real. E isso não precisa acontecer.

O caso das fotos no Vaticano parece exagerado (e é mesmo), mas todo mundo faz isso o dia todo: porque raios as pessoas compartilham nas redes sociais o restaurante onde estão, a comida que cozinham, quantos quilômetros correram? Porque existem tantos sites para você marcar os filmes e seriados que viu, os livros que leu, shows que foi, músicas que ouviu? Acho que um dos motivos é falta de assunto mesmo: a agonia de ver todo mundo “postando alguma coisa” e a pessoa sem nada pra dizer. Outro motivo, ao meu ver, é porque a experiência se perdeu. Para muitas pessoas hoje, fazer algo só por fazer e só para elas mesmas não é suficiente; elas precisam divulgar, todo mundo precisa saber o que ela gosta de fazer. Como se espalhar por aí que você está se divertindo garantisse que você está se divertindo mais...

Ao mesmo tempo que eu compreendo (divulgar que você viu e gostou de certo filme te coloca dentro de um grupo), acho isso bem triste. A espontaneidade está ficando igual - algo que é contra o próprio conceito de espontaneidade. E acompanhar a vida online de alguém ainda está bem longe de conhecê-la de verdade – mesmo que seja de alguém que tente muito colocar sua rotina inteira dentro da web.

Resultado: fica tudo no meio da caminho. Por exemplo: você vai no aniversário de um amigo, metade das pessoas você conhece, a outra metade nunca te deu um “oi”, mas já tem uma opinião sobre você (aliás, o que as pessoas mais têm nos dias de hoje é opinião formada sem conhecimento). O ponto de partida da relação já está todo bagunçado; não existem surpresas nos assuntos primários, que deviam despertar interesse, e não há interesse nos assuntos surpresas.

Outros exemplos: perceber um erro de português absurdo vindo de uma pessoa que fala o tempo inteiro dos milhões de livros que leu. Ou encontrar pessoalmente com alguém que twitta todos os dias que vai à academia e ver que a pessoa não emagreceu nada. O oversharing das redes coloca esse tipo de lupa julgadora nas pessoas – e o pior é que são elas que colocam essa lupa na própria cabeça.

Já falei disso em um texto anterior: à medida que a tecnologia se torna mais onipresente, nossa relação com ela se torna mais íntima, conferindo-lhe poder de influenciar decisões, humores e emoções. Mas é só se a gente deixar! Suas redes sociais não precisam ser um reflexo fiel da sua vida real o tempo todo, listando o que você faz ou onde está e com quem. Meu celular tem tecnologia pra entrar na internet e eu me conecto quando quero, sabe? Mas não sincronizo meu Twitter, meu Facebook nem meu e-mail com ele. Nenhuma janelinha vai pular dele enquanto eu estiver almoçando, no cinema ou dormindo. Eu escolhi que eu é que vou lá ver o que está acontecendo quando eu quiser – afinal, o celular está lá para me servir, não o contrário. Perceber isso faz muita diferença.

Um bom exercício em qualquer situação é aquele joguinho infantil dos “porquês”. Cheguei num restaurante com um amigo, mal tinha me sentado e ele pegou o celular dizendo “Já vou dar check-in!”. Eu perguntei porque, ele respondeu e perguntei mais umas vezes. No final das contas, ele não tinha motivo algum pra dar check-in ali. Não queria convidar ninguém ir pra lá também, não ia escrever uma crítica sobre o restaurante (esse é o propósito do Foursquare, não é?), nem queria se mostrar fodão (o lugar não era chique, nem caro, nem nada). Ele pareceu meio perdido, percebeu que fazia parte de um “rebanho socio-tecnológico” dos que fazem algo pois os outros também fazem, sem refletir sobre aquilo. O mesmo jogo serve pra ser feito antes de cada upload de foto, cada status novo. Que objetivo você quer alcançar tornando pública aquela informação pessoal sua?

Passou da hora de muita gente por aí amadurecer nesse sentido, saber separar as coisas. É uma campanha que pode parecer antiquada, mas poxa. Você está vivendo sua vida para você ou para os outros?


terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Os personagens urbanos que eu mais amo odiar


6 – O maluco do elevador
Só tem ele e você no elevador. Vocês dois descendo, indo pro térreo. Quando o elevador passa perto do quarto ou terceiro andar, ele sai de onde estiver e vai pra frente da porta. Mas, assim, frente mesmo; ele encosta a ponta do nariz na porta fechada! Mas o melhor é que depois que a porta abre ele não sai correndo, ele não estava com pressa alguma; ele quase comeu a porta do elevador pra sair rápido, mas você saiu depois e ultrapassou o cara em 2 passos. Oi?

5 – A amiga da empada
Perto do seu trabalho tem uma empada, uma padaria ou sei lá o quê. E lá é bom, então todo mundo vai todo dia. Super normal. Tão normal que quando tem uma pessoa a menos com a turma, a moça até pergunta cadê a tal pessoa. Super legal e educado. Mas começa a ficar meio estranho quando ela se intromete na sua conversa pra opinar sobre o caso que você contou pros seus amigos e quando ela começa a contar da vida dela e pedir sua opinião. Minha senhora, eu nunca vi a casa e não conheço seu ex-marido, como eu vou saber se o valor que ele vendeu o imóvel foi justo?

4 – A mãe entorpecida
A única coisa que me incomoda mais do que criança é mãe otária que acha que todo mundo têm que gostar do filho dela. Olha, quando uma criança vem na minha mesa, enfia a mão no meu prato e pega um pedaço do meu pão de queijo, eu espero que a mãe me peça desculpas pela falta de educação do muleque, xingue o menino e me ofereça outro salgado (e eu recusaria com um sorriso); certamente eu não espero que ela ignore o fato ou, pior, vire pro menino com voz de bebê e fale: “Que delícia esse seu pãozinho de queijo, heim”. Acorda! Seu filho só a pessoa mais importante do mundo pra você. Aceite o fato quando estiverem em público pelo menos. Tem coisa mais chata do que uma criança esguelando de chorar e a mãe do lado lendo um livro? Ele chora em casa o dia todo e você se acostumou, mas as pessoas ao redor não precisam (e nem devem) se acostumar. Tomem vergonha na cara; criança tosca pega mal pros pais também.

3 – Os playboys que gritam
Alguém me explica? Dá significado à sua vida colocar a cabeça pra fora da janela do carro e chamar um cara de viado? O que esse povo espera que vai acontecer no mundo depois disso? Aliás, o que achama que vai acontecer depois de buzinarem pra uma mulher gostosa na rua? Ela vai vir correndo pro carro? Ah, você acha que ela não sabia que ela era gostosa antes de você buzinar? Ou você acha que ela, mesmo não sabendo quem você é, tinha que saber sua opinião sobre a bunda dela? Parabéns. Freud tem notícias para vocês.

2 – As estátuas
Elas têm o resto do planeta mas param para fumar, conversar e apreciar a vista na única entrada do ambiente, no começo do corredor e no finalzinho da escada rolante.

1 – A tia do ônibus
Ela é a melhor/pior pois é a que tem mais variações. É a tia que, mesmo com o ônibus lotado, insiste em conversar (e alto) com a amiga que sentou no banco atrás do dela ou do outro lado do corredor! É a tia que não calcula bem o tamanho da mochila Company que carrega na barriga e sai empurrando todo mundo. Mas o melhor tipo de tia do ônibus é aquela ansiosa do asfalto, que não deixa ninguém entrar no ônibus antes dela e se garante com os braços abertos, como se tivesse na dança da cadeira em festa infantil. Aí, depois do corre corre todo e até de ter passado por cima dos velhinhos e deficientes que não conseguiram descer antes dela entrar, o que ela faz?? Para na roleta, abre a bolsa e começa a contar as moedinhas – deixando as outras 300 pessoas (com cartão e dinheiro já contado) esperando atrás. Amo!

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

C'est la vie

Lá quando eu tinha 18 anos eu me apaixonei (não no sentido romântico) pela amiga de um amigo. Ela era linda e estava sempre muito bem vestida e perfumada. A gente sentava junto em um restaurante e enquanto eu procurava a cerveja mais barata do cardápio, ela pedia manhattans e outros drinks que eu não conhecia ainda.

Nos cafés de Belo Horizonte, ela falava com desenvoltura sobre autores que eu não conhecia ou que tinha lido um livrinho apenas. As piadas mais inteligentes eram as dela. Os assuntos mais interessantes eram os dela. Ela me falava sobre suas idas à Paris, como gostava muito e conhecia bem aquele lugar. Lembro de me sentir tímido perto dela, um reflexo da minha ignorância.

O tempo passou, nos distanciamos e ficou bem claro que a gente só conversava por causa do amigo em comum. Tudo bem, sem problema, c'est la vie. E essa distância (escondida no "contato" apenas via redes sociais) se revelou extremamente interessante: todo aquele charme que eu via realmente estava lá, mas não era o resultado de uma busca genuína por conhecimento ou cultura. Ela não passava de uma herdeira. O ritmo em que ela devorava livros e música francesa era proporcional ao tempo que tinha disponível por não precisar trabalhar.

(Antes de qualquer coisa, eu admito que identifico em mim uma ponta de inveja aqui. A falta de tempo e dinheiro me priva de várias coisas e ver gente com isso em abundância me revolta um pouco. Mas que bom pra ela! Quero dizer, tem muita gente que prefere usar essas horas para fazer coisas idiotas - e ler autores russos está bem longe de ser uma perda de tempo -, então é louvável que seu ócio tenha sido usado com esse fim, não é essa minha questão)

Mas não consigo parar de enxergar dessa maneira: ela era (na verdade, ainda ainda é) só uma pessoa com tempo, nada mais do que isso. E tempo, ainda mais quando existe dinheiro, transforma todo mundo naquilo que a pessoa quiser ser. Ela é realmente inteligente, mas como ela ficaria sem os perfumes caros, as roupas sempre novas, sem "Monty Phyton"? Sem o tempo para as duas faculdades, as aulas de gastronomia, de francês, italiano e inglês? Deus, como seria ela sem uma empregada doméstica em casa? Não sei, mas seria uma outra pessoa, imagino.

Esse é meu ponto: essa pessoa teria bom gosto se ela não pudesse sustentar o bom gosto? Tudo que ela tinha conquistado (materialmente e intelectualmente) foi, na verdade, oferecido para ela de alguma forma.

Existe muita inteligência adormecida por aí, gente interessada que não consegue correr atrás - pois o ponto de partida rumo àquela inteligência é diferente pra cada pessoa e depende bastante do contexto dela; quase mais do que de sua vontade. Ao mesmo tempo, há quem não queira gastar energia. Eu disse que o que ela tinha conquistado lhe foi, na verdade, oferecido. Mas ela teve a opção de não aceitar. Então o mérito é dela sim. Uma outra amiga sonhava em trabalhar com cinema e animação, e hoje está estudando isso no exterior. Não é só porque ela quer, é porque ela pode. Mas não é conto de fadas, ela precisa ralar, tirar ótimas notas etc. Enquanto isso, tenho um outro conhecido cujos pais não fizeram faculdade e depois de muita economia e luta, puderam oferecer isso ao garoto. Mas ele não quis.

Sempre falava com minha terapeuta quando reclamava da vida: "O problema não é o que eu sou, é o que eu queria ser". Nunca me dou por satisfeito pois eu quero ler mais coisas, ver mais coisas, conhecer mais gente, mais lugares. E quando percebo gente assim, navegando com graça no oceano do tudo-na-mão, fico me perguntando se nossos sonhos para o futuro são (ou deviam ser) proporcionais ao nosso passado. Se os meus fossem, acho que me frustaria menos.

C'est la vie.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Acho que já te vi lá

Eu estava dentro do ônibus já no penúltimo capítulo do livro "My Horizontal Life", da Chelsea Handler: nele, ela narra as divertidas desventuras da festa de reunião da classe de seu melhor amigo gay, onde ela é convidada a fingir que é sua esposa. O tanto de mentiras contadas faz a história ir para caminhos cada vez mais engraçados.

Aí chegou meu ponto: estava indo a um Banco do Brasil perto da faculdade Fumec. As pessoas já estavam levantado - o ônibus estava bem vazio - e fiquei ao lado de uma menina bonita e de mochila que me olhou e disse:

- Você está indo pra Fumec?

"Não, eu formei tem um ano e meio - e nem foi pela Fumec" seria minha resposta honesta. Mas algo do livro me inspirou e o que eu falei, na verdade, foi outra coisa:

- Estou.

Que merda. Agora ela vai me fazer uma pergunta sobre o campus que deveria ser óbvia e eu não vou saber responder. Em um milésimo de segundo tentei lembrar o que sabia do lugar e uma imagem da única vez que estive lá dentro até chegou a aparecer na minha mente. Mas ao invés disso tudo, ela disse outra coisa:

- Acho que já te vi lá.

Ufa. Então resolvi chutar o balde. Sorri e apontei pra uma tatuagem vermelha que tenho no braço.

- Aposto que você está me reconhecendo por causa da tatuagem, né?

- Deve ser - ela disse rindo.

Não acreditei nessa menina, que viagem. Não sei muito bem se ela estava dando mole ou não, mas resolvi ir adiante. Só que o ônibus estava parado no sinal e o silêncio entre a gente ficou meio vergonhoso. Aí ela virou de volta pra mim:

- O que você estuda?

Pânico. O único curso que eu sabia que tinha lá era design que é, sem ofensas, um curso bem gay. E isso iria meio que finalizar o assunto, eu acho.

- O que você acha que eu estudo? - perguntei, jogando verde.

- Design?

Eu ri, disse que todo mundo achava isso ("deve ser por causa das minhas roupas"), mas que era algo que não tinha nada a ver. Pedi pra ela chutar outra coisa. Agora, com a dica, ela foi longe:

- Direito?

- Isso. Sabia que você ia adivinhar - disse e ri.

Descemos. Falei que ia ao banco antes e que qualquer dia a gente conversava mais. Ela despediu de mim com dois beijinhos. Fim.

domingo, 13 de novembro de 2011

Toda unanimidade é burra


No meio desse ano eu assisti o documentário "Daquele Momento em Diante", que fala sobre a trajetória musical de Itamar Assumpção, da Vanguarda Paulista na década de 1980. Ele foi músico, compositor e cantor, gravou vários discos e, teoricamente, nunca fez sucesso no Brasil naquela época. Era "alternativo demais".

Em um vídeo, ele falava sobre a facilidade de fazer um show e ser bem recebido (e, digamos, compreendido) na Alemanha. "No Brasil é tudo uma dificuldade", ele compara. Aí suspira e diz assim: "Até quando esse país vai viver de Chico e Caetano?".

Na semana passada, Chico Buarque esteve na minha cidade, Belo Horizonte, e um dos jornais mais lidos daqui, o Estado de Minas, colocou o músico na capa. As manchetes eram títulos de músicas etc etc. De uma breguiça fenomenal. Uma coisa que chamou atenção foi uma linha que dizia assim: "Chico Buarque é unanimidade".

Se fosse numa sala de aula, era hora de levantar a mão e citar uma frase de Nelson Rodrigues pra professora: "Toda unanimidade é burra".

Eu entendo o fascínio das pessoas por Chico, mas acho que a hora dele passou. O mundo mudou e ele ficou parado. Direito dele. Mas é que gostar das músicas dele parece uma coisa obrigatória aqui nesse país. Mas, convenhamos, ele perdeu a mão nas composições - e tem lá mais que uma década. Não era muito mais legal quando ele era censurado e suas letras eram um desafio? Agora tanto faz.

Mas tudo bem, cada um tem o ídolo que merece. Se vocês acham que um velhaco amarelado continua sendo sexy e bom cantor, que bom pra vocês. E pra ele, claro.

O que me deixa chateado é essa babação de ovo excessiva. Pois isso cerca o cara de uma manta que ele não devia ter mais - não estou falando que ele devia ser desrespeitado, nada disso. Mas li que ele mesmo ficou abalado quando descobriu, há alguns anos, que tinham comunidades "Eu odeio Chico Buarque" no Orkut. Provavelmente ele também acreditava nessa unanimidade. Talvez seja hora dos fãs pegarem leve, serem mais críticos.

Sei lá. Ultimamente tenho concordado mais com Nelson Rodrigues do que com Angélicas, Renatas Marias, Ninas e Lolas. Fãs, em geral, são pessoas chatas, que não gostam de ser contrariadas. Fãs de MPB então, sai de baixo. Li um texto que os compara com religiosos fervorosos: se você não acredita no deus deles, está condenado.

A declaração do humorista Marcelo Madureira, que chamou o cineasta Glauber Rocha de "uma merda”, também sacudiu o Rio de Janeiro. Está vendo? O problema é essa suposta unanimidade. Se muita gente acha, você tem que achar também?

Detalhe: dia 31 de outubro, alguns dias antes do show de Chico em BH, foi o centenário de Carlos Drummond de Andrade, um dos escritores mais respeitados do país, e mineiro. Adivinha se ele foi capa do Estado de Minas...

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Quem são os homofóbicos?

Regina Navarro Lins, psicanalista, fala de sexualidade e relacionamentos em sua coluna na internet. Por acaso, me deparei com uma sobre homossexualidade. Aqui tem ela na íntegra. Mas resolvi fazer um texto contando o que ela fala nas minhas palavras.

A gente sempre julga as coisas com os valores do nosso tempo, com os que nos foram ensinados, sem saber que o mundo foi e é muito diferente dependendo da época e do lugar analisados. Religiões, crenças, ideias, valores e costumes nasceram, se firmaram e até passaram e você nem ficou sabendo. A homossexualidade é um exemplo.

Ela foi uma força conservadora na Grécia clássica (século V a.C.), por exemplo. Em algumas cidades, era uma prática necessária dos ritos de passagem da juventude. Sua repressão só começou nos séculos XII e XIII.

No século XIX, a atividade homossexual deixou de ser classificada como pecado e passou a ser considerada doença. Mas é interessante perceber como o tabu só diminuiu nos anos 60, com o surgimento dos anticoncepcionais: a dissociação entre o ato sexual e a reprodução possibilitou aos homossexuais sair um pouco da clandestinidade na medida em que as práticas homo e hétero se aproximaram. Afinal, ambas visavam o prazer.

Mas a discriminação com gays continua, no formato de piadinha e agressões. Qual o motivo disso então? É que ultrapassa as quatro paredes, claro. Segundo ela, a homofobia deriva de um tipo de pensamento que trata diferença e inferioridade de formas parecidas.

Homofóbicos são, então, pessoas conservadoras e rígidas, no sentido de serem favoráveis à manutenção dos papéis sexuais tradicionais. Pois quando se considera que um “homem homossexual não é homem”, fica óbvia a tentativa de preservação dos estereótipos masculinos e femininos, uma coisa tradicional que tem várias formas. E isso, que já foi amplamente discutido nesse blog, é uma bobagem com os dias contados.

Enfim, a homofobia reforça a frágil heterossexualidade de muitos homens. Ela é, então, um mecanismo de defesa psíquica, uma estratégia para evitar o reconhecimento de uma parte de si mesmo que a pessoa não quer aceitar. Ou acha que é coincidência que todos os ataques a gays são sempre homens atacando homens?

Não acho que necessariamente todo homofóbico é um gay enrustido, mas dirigir a própria agressividade contra os homossexuais pode ser simplesmente um modo de exteriorizar os seus próprios conflitos - e assim torná-los suportáveis.

E acaba tendo também uma função social, especialmente em grupos neo-nazistas, mas também em bares e nos escritórios por aí: um heterossexual que exprime seus preconceitos contra os gays pode ganhar a aprovação dos outros héteros ao redor, aumentando a confiança em si. Não tem meio termo: chamou o time adversário de boiola, chamou o motorista infrator de viado, chamou o colega de trabalho de afetado? Tudo é a mesma farinha. Tudo é preconceito pois o que há de parecido entre as expressões é o fato de igualar os gays a algo que você considera perdedor, errado ou inferior.

A homofobia não deixará de existir num passe de mágica, mas qual é a fórmula? Caminhamos hoje (lentamente, eu diria) para uma sociedade de parceria. E, se nela o desejo de adquirir poder sobre os outros não for preponderante, a homossexualidade deixará de ser tratada como anomalia, passando a ser aceita simplesmente como uma diferença.

Sinceramente, não sei se estarei vivo pra ver isso.