quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Algo que pensei nos últimos dias

Foi Santo Agostinho, no terceiro século da idade média, quem percebeu pela primeira vez a conexão da inveja com a constituição primeira do ser humano. Ele elaborou uma frase sobre seu significado: “Video, sed non invideo”, ou seja, “vejo, mas não in-vejo”. Quer dizer, então se vejo, posso invejar. O erro – não dele e sim nosso – é atribuir inveja ao desejo pelos objetos dos outros apenas. É possível ter inveja em vários níveis, inveja da aparência e dos valores de terceiros até.

Exemplo? Que tal um estudo da Universidade Estadual de Washington sobre egoísmo? Ele demonstrou que certos atos de altruísmo, ao invés de melhorar a nossa reputação, podem fazer com que os outros não gostem da gente.

Em uma série de testes, os pesquisadores dividiram os voluntários em grupos de cinco e deram a eles “pontos”, que poderiam ser guardados ou usados para “comprar” vales-refeição. E disseram que abrir mão dos pontos aumentaria as chances do grupo de receber uma recompensa em dinheiro. Na verdade, enquanto a maioria fazia trocas justas de um ponto por um vale, alguns dos membros dos grupos eram atores e agiam, propositalmente, de forma egoísta, segurando todos os pontos para si, ou altruísta, abrindo mão de vários pontos em troca de menos vales, para que o grupo todo recebesse a recompensa final.

O que aconteceu foi que, ao final, a maioria dos voluntários de verdade disse que não gostaria de trabalhar com os egoístas de novo, obviamente. Mas a surpresa foi que grande parte deles também declarou o mesmo sobre os bonzinhos.

Pois é, até a pesquisa diz, bonzinho só se fode. Esse ressentimento está associado à inveja, acho. Pois vem muito mais de uma vontade de “ser como aquela pessoa” do que “não quero que aquela pessoa seja assim”. Tanto, que era a caridade dos colegas desprendidos que fazia os outros se sentirem mal – é que, no meio dos diferentes, se você acha que eles têm razão, você se sente pressionado a agir da mesma forma.

Na mesma linha de raciocínio estão todos esses que têm preguiça de discutir sustentabilidade, vegetarianismo, reciclagem de lixo, autoconhecimento, consumo consciente. Eles sabem que são ideias e conceitos mais corretos do que aqueles que levam em sua vida pessoal, mas a falta de força de vontade para mudar traz uma culpa por ter essa preguiça de fazê-lo – e é ela que alimenta essa inveja travestida de raiva travestida de indiferença. Admitir que se fez algo errado é bom, mas não torna o erro melhor.

Não estou propondo muitas discussões aqui. É só algo que pensei nos último dias.

Para ouvir depois de ler: Oh No! - Marina and the Diamonds


3 comentários:

Gabriel Cadete disse...

Outra coisa que pensei: Na pesquisa, os envolvidos sabiam exatamente do que os altruístas estavam abrindo mão ao colaborar com o grupo. Na vida real não é assim, nunca sabemos que sofrimentos e esforços estão por trás de cada ato bom.

If God is a DJ, life is a Dancefloor disse...

Como diz o Keane, "and if I stop for a minute, I think about things I really don't wanna know".

Ninguém quer parar e refletir. Caso contrário, terão de enxergar seus próprios erros e suas falhas. O problema é que só assim podemos evoluir. Logo, ninguém evolui.

Anônimo disse...

Adorei essa imagem!